Capítulo Sessenta e Cinco - Gentileza
Às seis horas da tarde o ônibus sacolejava no sentido bairro. Já pelo meio do caminho, algumas pessoas em pé, uma senhora de sessenta e poucos anos estica o braço no ponto, forçando o coletivo a atrasar mais alguns instantes sua obstinada viagem. Degrau, degrau, degrau e um rapazote muito solícito se prontifica a ceder seu lugar num dos bancos para a pobre velhota, que docemente recusa.
-Já vou descer daqui a pouco.
Mas o rapazote vê nos olhos da velhota o quanto ela está cansada de um dia exaustivo.
-Não, pode sentar.
A senhora se comove com a gentileza do rapaz, mas recusa novamente a oferta.
-Eu não tô cansada, não. Pode ficar.
O rapaz, que é novo, mas não é alheio às dores alheias, vê lá no fundo dos olhos da velha o quanto ela está cansada de uma vida exaustiva.
-Mas eu faço questão!
A senhora, que nunca gostou muito de contrariar as pessoas, especialmente as pessoas que ela não conhece, até aceitaria sentar-se, se não tivesse que se levantar um ponto depois.
-Mas eu já vou descer!
-Mas a senhora disse isso a dois pontos atrás!
-Pois então, vou descer no próximo.
A essa altura, o rapaz já estava de pé, ao lado da senhora, que se recusava a se sentar. Atrás dos dois, um senhor de meia-idade olhava para o banco vazio, cansado depois de um dia de trabalho de pé na cozinha de um hospital.
-Olha minha senhora, por acaso você tem nojo de mim?
-Como é que é?
-Por que a senhora se recusa tão veementemente a se sentar no banco onde eu estava sentado?
-Nojo de você? Eu acho que você tá é meio maluco.
O rapaz agarra então o braço da velha. Gentilmente.
-Pois agora a senhora vai se sentar aqui!
-Me larga, seu doido!
O incidente, que já havia chamado a atenção de todos os passageiros, do cobrador, do motorista e até de um homem no caminhão ao lado, dividiu a opinião dos presentes.
-Deixa ela, rapaz. A senhora não quer sentar!
-Mas o rapaz só tava querendo ser educado! Custava ela aceitar?
E a velha tentando se soltar.
-Olha aí! Perdi meu ponto! Motorista! Motorista! Vou descer!
-Pois se a senhora vai descer, eu também vou! Quero ver se esse ponto é o seu ponto mesmo.
-Que isso? Vai me seguir agora?
E o motorista irritado.
-Eu não posso ficar aqui o dia inteiro esperando!
O rapaz puxa a velha pelo braço, forçando-a escada abaixo. A velha tropeça, cai no chão, levando o rapaz junto, os dois rolando até o meio-fio.
-Chama uma ambulância!
-Ah, agora vão levar ela pro hospital. Só pra disfarçar, por que eu sei que aqui não é o ponto dela. Não precisa, não. Ela que pegue o próximo ônibus.
O rapaz sobe no ônibus, senta-se no mesmo banco de antes. Olha para uma estudante, assustada com o que acabou de acontecer.
-Quer que eu carregue seu caderno?
10 Reclamação:
quando eu for velhinha, espero ter meu carro!
Hahaha, muito bom. Eu sempre passo por situações parecidas. :(
Um carderno com uma bomba de tinta já parece ser uma boa idéia (de geríco, mas boa...). Rapaz, que bom que voltou a postar. Espero que este texto seja novo, pois perdí o fio da meada de sua re-postagem. Pessoas obcessivamente gentís realmente dão no saco.
Abraços. Até mais.
A propósito, quanto o contador de post's passa de uma reclamação, são"2 reclamações"... e tenho dito!
2 reclamação é muito mais engraçado.
E tenho dito!
Essas histórias!
O Kra era psicológicamente abalado. Quero nem ver quando ELE for velho.
nossa, isso dá curta.
adorei esse blog!
muito bom. =D
por isso que não devemos ceder nossos lugares...
Hahaha!! Ótimo! Uma risada depois desse dia todo torto!
Pelo menos ele era cavalheiro. Até demais, creio eu.
hahaha...passei alguns anos longe do blog...resolvi voltar e escrever e qual nao é a minha surpresa qdo vejo q ainda existe um espacinho pra mim aqui...
eu parei de postar fotos das minhas pequenas no flog e voltei a postar no diariodanana.blig
vamos ver qto tempo dura...
adorei seu post, pra variar!
como vc está? será que ainda aparece por aqui?
beijinhos,
Nana ;)
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